Instabilidade financeira: por que é uma emergência de saúde pública?
- Silvia Alambert Hala
- há 1 dia
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Publicado em 22/08/2025
Por Silvia Alambert Hala (@silviaalambert_edufin)
Por muito tempo, a instabilidade financeira foi tratada como um problema individual, algo que se resolvia com “mais trabalho”, “mais disciplina” ou “mais sorte”. No entanto, os impactos econômicos sobre a saúde física e mental são tão profundos que precisamos mudar o enquadramento: trata-se de um problema coletivo e urgente, que deveria ser encarado como uma emergência de saúde pública.
O peso invisível da insegurança financeira
Quando uma família vive sob constante insegurança financeira, o corpo e a mente entram em estado de alerta permanente. É o chamado estresse tóxico: níveis elevados de cortisol circulam por longos períodos, prejudicando o sono, a imunidade, a capacidade de concentração e até a memória.
Essa pressão não é apenas psicológica: ela adoece fisicamente, aumentando o risco de doenças cardiovasculares, hipertensão, diabetes e depressão.
Segundo a American Psychological Association, questões financeiras estão entre os principais gatilhos de ansiedade e conflitos familiares. No Brasil, dados do Serasa mostram que mais de 70% das famílias convivem com algum nível de endividamento.
O ciclo vicioso do estresse financeiro
A instabilidade financeira cria um círculo vicioso. O estresse prejudica a tomada de decisão, o que pode levar a escolhas financeiras menos estratégicas, aprofundando ainda mais o desequilíbrio.
Esse ciclo é especialmente cruel para crianças e adolescentes, que absorvem a insegurança do ambiente familiar e a reproduzem, tanto emocional quanto financeiramente, ao longo da vida.
Impactos na infância e adolescência
Pesquisas mostram que crianças expostas a estresse econômico crônico têm maior probabilidade de desenvolver problemas de saúde mental, dificuldades acadêmicas e padrões de consumo imediatistas.
Não se trata de “culpa” dos pais, e sim da falta de políticas públicas e de uma cultura de educação financeira desde cedo.
Educação financeira como prevenção em saúde pública
Assim como campanhas de vacinação reduzem doenças e campanhas antitabagismo diminuem casos de câncer, programas de educação financeira de qualidade podem reduzir os efeitos nocivos da instabilidade econômica.
Isso não significa ensinar crianças apenas a “não gastar” ou “guardar no cofrinho”. É desenvolver:
Autocontrole e planejamento: entender a diferença entre necessidade e desejo.
Visão de longo prazo: perceber que pequenas escolhas diárias constroem (ou destroem) o futuro.
Raciocínio crítico: questionar ofertas, propagandas e padrões de consumo impostos.
Consciência social: compreender que a saúde financeira individual está ligada à saúde da comunidade.
Quando crianças e jovens aprendem a lidar com dinheiro de forma saudável, também aprendem a lidar com ansiedade, frustrações e expectativas — habilidades que são tão emocionais quanto financeiras.
Um problema coletivo exige soluções coletivas
A instabilidade financeira não pode ser tratada como “fraqueza individual”. É um problema social que exige respostas em múltiplas frentes:
Políticas públicas: integrar a educação financeira no currículo escolar, de forma contínua e adaptada à realidade local.
Apoio às famílias vulneráveis: programas que unam saúde mental e capacitação financeira.
Ações comunitárias: redes de apoio que reduzam o isolamento causado pela vergonha ou pelo medo de falar sobre dinheiro.
Assim como uma epidemia exige ação coordenada de governos, comunidades e famílias, a “epidemia” de instabilidade financeira também precisa de respostas coletivas.
Por que ignorar a instabilidade financeira custa caro
Ignorar o impacto da instabilidade financeira na saúde não apenas prolonga o sofrimento, mas também aumenta os custos para toda a sociedade:
Mais atendimentos médicos.
Mais licenças de trabalho.
Menor produtividade.
Mais desigualdade social.
Tratar o tema como emergência de saúde pública não é exagero. É reconhecer que dinheiro e saúde são indissociáveis e que, ao cuidar de um, estamos prevenindo doenças, fortalecendo famílias e construindo comunidades mais equilibradas.
Atividade prática: o “Mapa da Tranquilidade”
Objetivo:
Ajudar crianças e jovens a compreenderem que segurança financeira não é sobre “ter muito dinheiro”, mas sobre planejar, prevenir e ter recursos para lidar com imprevistos — e como isso se conecta à sensação de bem-estar.
Faixa etária:
A partir de 8 anos.
Materiais:
Papel grande ou cartolina, canetas coloridas, post-its.
Passo a passo:
Introdução
Explique que segurança financeira é como um “escudo” que nos ajuda a viver com mais tranquilidade, mesmo quando algo inesperado acontece.
Faça um paralelo com saúde: assim como usamos máscara para nos proteger de doenças ou guardamos remédios para emergências, também podemos nos proteger financeiramente.
Desenho do mapa
Peça que desenhem no centro da cartolina um grande círculo com a palavra TRANQUILIDADE.
Em volta, criem três círculos menores:
Necessidades básicas (moradia, comida, transporte, saúde).
Proteção (poupança, seguro, fundo de emergência).
Planos e sonhos (viagens, estudos, hobbies).
Preenchendo com ideias
Distribua post-its para que escrevam pequenas ações que podem ajudar a manter cada círculo protegido.
Exemplo: “guardar R$ 5 por semana”, “pesquisar antes de comprar”, “reparar antes de substituir”.
Compartilhamento
Cada criança apresenta uma ação para o grupo.
Discuta como essas ações diminuem o estresse do dinheiro e aumentam a tranquilidade.
Conclusão
Reforce que a tranquilidade financeira é construída aos poucos, com escolhas conscientes.
Incentive a família a criar seu próprio Mapa da Tranquilidade em casa e revisá-lo de tempos em tempos.
Quem ama também educa financeiramente.
Dinheiro e saúde caminham juntos
A instabilidade financeira é muito mais do que um problema de bolso: é um problema de saúde pública. Reconhecê-la como tal é o primeiro passo para criar políticas, programas e iniciativas que promovam bem-estar coletivo.
Cuidar das finanças é cuidar da saúde — e uma sociedade financeiramente saudável é também uma sociedade mais equilibrada.
Silvia Alambert Hala é mãe, empreendedora educacional, cofundadora da www.creativewealthintl.org, empresa que atua no desenvolvimento de programas de educação financeira para crianças e jovens e treinamento de multiplicadores dos programas no Brasil e em diversos países há cerca de 20 anos, palestrante Tedx São Paulo Adventures, coautora do livro “Pai, Ensinas-me a Poupar” (editora Rei dos Livros, Portugal), educadora financeira de crianças, jovens e suas famílias.
RadiumWeb e Creative Wealth Internacional firmaram uma parceria colaborativa para fornecer educação financeira abrangente para brasileiros em todo o mundo.