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A chupeta para Adultos e o Emburrecimento da Sociedade: Um Sintoma da Falência Educacional Contemporânea

Chupeta para adultos como metáfora da infantilização e crise educacional no Brasil
A infantilização da sociedade em símbolos cotidianos: a chupeta ao lado do smartphone como metáfora do imediatismo e da falta de maturidade que marcam nosso tempo.

Publicado em 11/09/2025

Por Ricardo São Pedro (@radiumweb)


Recentemente, assisti a um vídeo da cantora Luiza Possi que me chamou a atenção de imediato. No registro, ela comentava, com espanto e ironia, sobre a moda da "chupeta para adultos" e usava esse exemplo para refletir sobre o rumo que a nossa sociedade vem tomando. Suas palavras me inquietaram e despertaram a vontade de escrever este artigo — não apenas pela curiosidade do fato em si, mas pelo que ele simboliza: um retrato da infantilização coletiva e do esvaziamento cultural que nos cerca.


Contudo, ao observar esse fenômeno com maior profundidade antropológica, percebo que a chupeta adulta é apenas a ponta do iceberg de uma crise educacional que se arrasta há décadas, envolvendo tanto o papel das famílias quanto das instituições de ensino.


A Moda da Chupeta para Adultos e a inversão de valores e suas raízes educacionais


Luiza lembra que, em sua infância, havia um desejo social de crescer e se desenvolver: aprender idiomas, fazer faculdade, tornar-se médico, engenheiro ou até astronauta. Havia um ideal de progresso. Hoje, no entanto, ela observa uma inversão preocupante: "vencer na vida" deixou de ser alcançar conquistas concretas para se resumir, muitas vezes, a aparecer nos stories de um influenciador digital.


Essa transformação não surgiu do vazio. Ela é resultado de uma erosão sistemática do projeto educacional que começou no seio familiar e se aprofundou nas salas de aula. Por décadas, assistimos ao enfraquecimento da autoridade educativa dos pais, que, pressionados pela culpa do trabalho excessivo e pela sedução do consumismo, passaram a confundir amor com permissividade. A educação por limites foi substituída pela educação por negociação, criando gerações que não aprenderam a lidar com frustrações básicas.


É como se o ser tivesse sido substituído pelo aparecer. A busca por visibilidade, ainda que vazia, ocupa o lugar da construção de conhecimento e realização pessoal — uma dinâmica que encontrou terreno fértil em lares onde o entretenimento substituiu a formação e em escolas que priorizaram a autoestima sobre a excelência.


O Papel da Família na Formação do Caráter


A família, como primeira instituição formadora, tem falhado em estabelecer os alicerces necessários para o desenvolvimento de indivíduos críticos e responsáveis. A tendência de transformar filhos em "pequenos reis" — protegendo-os de qualquer desconforto e atendendo suas demandas de forma imediata — criou uma geração que chegou à vida adulta sem desenvolver tolerância à frustração.


Quando observamos adultos usando chupetas como símbolo de "autocuidado" ou "quebra de tabu", estamos diante de indivíduos que não conseguiram completar o processo natural de amadurecimento psíquico. A chupeta, objeto de transição da primeira infância, ressurge como muleta emocional em pessoas que não aprenderam mecanismos saudáveis de autorregulação.


Os pais contemporâneos, muitas vezes sobrecarregados e inseguros em seu papel educativo, terceirizaram decisões fundamentais para algoritmos de redes sociais, influenciadores digitais e tendências momentâneas. O resultado é uma formação moral fragmentada, onde valores sólidos deram lugar ao relativismo absoluto do "cada um faz o que quer".


A Escola e a Abdicação de seu Papel Formativo


Paralelamente, as instituições escolares passaram por um processo de despolitização pedagógica que as afastou de sua função primordial: formar cidadãos críticos e culturalmente instruídos. Sob o discurso da "educação inclusiva" e da "pedagogia do afeto", muitas escolas abandonaram padrões de excelência e rigor intelectual.


A escola contemporânea, em muitos casos, transformou-se em um espaço de entretenimento onde o conhecimento compete em desvantagem com a necessidade de "engajar" os estudantes. O resultado é uma geração que chega ao ensino superior — quando chega — sem dominar competências básicas de leitura, escrita e raciocínio lógico.


Essa precarização educacional não é acidental. Ela reflete uma escolha social de priorizar métricas quantitativas (aprovação, permanência, satisfação) sobre resultados qualitativos (aprendizagem efetiva, desenvolvimento crítico, formação cultural). Quando a escola deixa de ser um espaço de confronto intelectual e transformação pessoal, ela se torna cúmplice da infantilização social.


O Culto ao Nada e seus Agentes


Outro ponto levantado por Luiza é a transformação de pessoas comuns em celebridades pelo simples fato de exporem a própria vida. Nada contra quem escolhe viver assim, mas o problema está no valor social atribuído a esse tipo de conteúdo.


Enquanto personalidades midiáticas recebem atenção desproporcional, debates sérios sobre economia, educação ou política são ignorados. Pior: grandes portais de notícia também se rendem à lógica do clique, dedicando mais espaço ao cotidiano de famosos do que a temas que impactam de verdade a vida do cidadão.


Este fenômeno se retroalimenta com as deficiências educacionais já mencionadas. Uma população com baixo capital cultural naturalmente gravitará em direção a conteúdos que não exijam esforço cognitivo. A espetacularização do vazio encontra audiência justamente porque ela corresponde ao nível intelectual médio de uma sociedade que foi sistematicamente deseducada.


A Infantilização Coletiva como Projeto Político


A "chupeta para adultos", no fundo, é uma metáfora potente, mas também um sintoma de algo mais profundo. Representa a dificuldade crescente de amadurecer, assumir responsabilidades e encarar a vida adulta com criticidade. Essa infantilização não é apenas uma questão de gosto, mas de cidadania: quanto mais nos fixamos em distrações, menos preparados estamos para lidar com problemas estruturais do país.


Em uma perspectiva antropológica mais ampla, sociedades infantilizadas são sociedades mais facilmente controláveis. Cidadãos que não desenvolveram pensamento crítico, que buscam gratificação imediata e que confundem liberdade com libertinagem são menos propensos a questionar estruturas de poder ou a engajar-se em projetos coletivos de longo prazo.


A chupeta adulta, nesse contexto, não é apenas um produto estranho do mercado, mas um símbolo perfeito de uma sociedade que renunciou à maturidade. Se a sociedade se contenta com pouco — ou pior, com o nada —, o risco é formar gerações menos críticas, mais manipuláveis e distantes das conquistas que, um dia, foram sonho coletivo.


O Ciclo Vicioso da Mediocridade


O mais preocupante é observar como esse processo se retroalimenta. Pais infantilizados criam filhos sem limites, que chegam a escolas despreparadas para oferecer formação sólida, que por sua vez produzem adultos incapazes de exercer a parentalidade educativa. O ciclo se fecha e se aprofunda a cada geração.


Paralelamente, uma sociedade que celebra a mediocridade e o vazio cultural produz conteúdo midiático cada vez mais raso, que por sua vez influencia os padrões de comportamento e aspiração das novas gerações. A chupeta para adultos viral nas redes sociais não é causa, mas consequência desse processo degenerativo.


Caminhos para a Reversão: Educação como Resistência


Reverter esse quadro exige uma reconquista consciente do papel educativo tanto da família quanto da escola. Não se trata de retroceder a modelos autoritários do passado, mas de recuperar a legitimidade da autoridade educativa baseada no conhecimento e na experiência.


As famílias precisam redescobrir que educar inclui inevitavelmente frustrar, limitar e exigir. A escola precisa reconquistar seu papel de instituição cultural, onde o acesso ao patrimônio intelectual da humanidade se sobrepõe às demandas imediatas do entretenimento.


É fundamental compreender que a educação verdadeira é sempre um processo de violência simbólica legítima — ela arranca o indivíduo de sua zona de conforto e o confronta com realidades maiores que suas experiências imediatas. Sem essa "violência" educativa, não há crescimento intelectual nem moral.


A Conexão com o Planejamento Financeiro e de Vida


Sei que muitos devem estar se perguntando por que abordo temas que aparentemente fogem da educação e planejamento financeiro, foco principal desta plataforma. Contudo, é fundamental compreender que assuntos como este têm relação direta e profunda com nossa capacidade de construir uma vida financeira sólida e próspera.


O planejamento financeiro é, antes de tudo, planejamento de vida. E toda construção de vida depende da educação que recebemos — familiar e formal — das escolhas que nossos pais fazem por nós durante nossa formação e, posteriormente, das decisões que tomamos quando assumimos autonomia sobre nosso destino.


Viver em uma sociedade que deixou de valorizar o conhecimento e se perde no vazio de mentes que não conseguem enxergar além do que se passa nas redes sociais — conteúdo que frequentemente nada agrega à vida de ninguém — representa um perigo real para nossa capacidade de prosperidade individual e coletiva. Uma população infantilizada, que busca gratificação imediata e foge de responsabilidades, jamais desenvolverá a disciplina e a visão de longo prazo necessárias para construir patrimônio ou tomar decisões financeiras inteligentes.


Não estou aqui demonizando as redes sociais. Quando bem utilizadas, elas podem ser ferramentas poderosas de aprendizado e crescimento pessoal. O problema está na condução que tem sido dada a uma grande parcela de nossa população, direcionando-a para o aproveitamento daquilo que não acrescenta valor algum ao desenvolvimento humano.


A chupeta para adultos, nesse contexto, simboliza perfeitamente uma mentalidade que é antítese do planejamento: a busca por conforto imediato, a recusa em amadurecer e a incapacidade de pensar estrategicamente sobre o futuro. Como pode alguém que não consegue nem mesmo assumir as responsabilidades básicas da vida adulta construir um patrimônio ou planejar uma aposentadoria digna?


Que Legado Estamos Deixando?


O desabafo de Luiza Possi revela uma angústia legítima: o medo de que estejamos entregando aos nossos filhos uma sociedade mais rasa, onde a irrelevância se disfarça de importância. E aqui está a pergunta que fica para nós: que legado queremos deixar?


Se continuarmos a cultuar o vazio, a terceirizar a educação para algoritmos e a confundir progresso com novidade, o futuro será uma versão ampliada dessa infantilização. Mas se recuperarmos o valor do conhecimento, da cultura e da maturidade — assumindo nossos papéis educativos com coragem e determinação —, ainda há tempo de reverter essa curva descendente.


A chupeta pode até ser um objeto curioso, mas não pode se tornar símbolo daquilo que aspiramos como sociedade. Nossa responsabilidade histórica é garantir que as próximas gerações tenham acesso a uma educação que as prepare não para a mediocridade viral, mas para os desafios complexos de uma civilização em transformação.


O futuro de nossa sociedade depende de nossa capacidade de dizer "não" à infantilização coletiva e "sim" ao projeto civilizatório que a educação genuína sempre representou.

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